Browsing by Author "Costa, Ricardo Jorge Teixeira da"
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- A Influência da Amiodarona na Tiroide: Uma Revisão da LiteraturaPublication . Costa, Ricardo Jorge Teixeira da; Oliveira, Maria Elisa Cairrão RodriguesA amiodarona é um antiarrítmico classe III com elevado grau de eficácia, sendo mesmo o único antiarrítmico com impacto na sobrevida dos pacientes, acabando por se tornar no fármaco mais utilizado mundialmente no tratamento de arritmias. Apesar da sua elevada eficácia, esta apresenta uma vasta quantidade de efeitos adversos que se podem manifestar em diversos sistemas do corpo humano. No entanto, e apesar de bem relatados estes efeitos indesejados, não existe atualmente alternativa viável que permita a sua substituição sem compromisso da saúde dos pacientes que se encontram dependentes deste fármaco. Relativamente ao seu impacto na tiroide, a amiodarona apresenta vários mecanismos capazes de induzir dano nesta glândula, desregulando o seu normal funcionamento. Sendo esta um fármaco constituído por iodo, perfazendo este 2/3 do seu peso molecular, o excesso deste ião leva a toxicidade tiroideia. Não obstante, existem também mecanismos independentes da sua quantidade de iodo, ou seja, mecanismos atribuídos a outras propriedades da amiodarona, nomeadamente a sua semelhança estrutural com a hormona tiroideia triiodotironina, a inibição da conversão da tetraiodotironina em triiodotironina, a citotoxicidade direta que apresenta na glândula tiroideia independente do iodo e a sua capacidade de precipitar ou exacerbar autoimunidades órgão-específicas. Embora todos os pacientes tratados com amiodarona demonstrem alterações nos testes de função tiroideia, apenas 15-20% destes desenvolvem algum nível de disfunção desta glândula. Esta disfunção pode tratar-se de um hipotiroidismo induzido por amiodarona ou de um hipertiroidismo induzido por amiodarona, existindo fatores que predispõem ao aparecimento de cada uma destas patologias. Relativamente ao hipertiroidismo induzido por amiodarona, este tem apresentação semelhante a outros hipertiroidismos de diferente etiologia e pode dividir-se no tipo 1, tipo 2 e misto/indefinido. O tipo 1 consiste num hipertiroidismo induzido pelo excesso de iodo, o tipo 2 é um hipertiroidismo induzido por tiroidite destrutiva e o misto/indefinido trata-se de uma combinação de ambos. O hipertiroidismo induzido por amiodarona parece desenvolver-se mais em áreas com menor exposição a iodo, especialmente no caso do tipo 2, em pacientes jovens, no sexo masculino, em pacientes com cardiomiopatia dilatada, sarcoidose cardíaca, bócio, índice de massa corporal baixo, cardiopatia cianótica complexa, cardiomiopatia isquémica e autoanticorpos tiroideus positivos. Em casos extremos, este quadro de hipertiroidismo pode traduzir-se em tempestade tiroideia, constituindo uma emergência médica. No caso do hipotiroidismo induzido por amiodarona, este apresenta também clínica semelhante a outros tipos de hipotiroidismo de diferente etiologia. Paralelamente ao hipertiroidismo induzido por amiodarona, este parece ser mais prevalente em indivíduos com maior exposição a iodo, valores de tetraiodotironina basal baixos, valores de hormona estimulante da tiroide basal altos, sexo feminino, fração de ejeção ventricular esquerda baixa, diabetes mellitus, autoanticorpos tiroideus positivos, hipotiroidismo subclínico subjacente, tiroidite crónica autoimune, polifarmácia, especificamente =5 fármacos, idade superior a 65 anos, preparações anti-anémicas e anti-gota, combinação de amiodarona com inibidores da xantina-oxidase, fármacos colagogos e protetores hepáticos, sendo estes dois últimos indicativos de patologia hepática subjacente podendo a farmacocinética da amiodarona ser alvo de alterações. Em casos extremos, pode desenvolver-se coma mixedematoso, sendo necessária uma rápida intervenção e reversão do quadro. No que diz respeito à periodicidade de monitorização da função tiroideia, esta é ainda incerta, no entanto existem guidelines que recomendam a testagem da função tiroideia em todos os pacientes previamente ao início do tratamento com amiodarona, com testagem posterior ao 1º e 3º meses de tratamento, seguidas de testagem contínua em intervalos de 6 meses até cessação da terapêutica. Atualmente, a abordagem terapêutica utilizada para casos de disfunção tiroideia passa pela utilização de fármacos antitiroideus no caso do hipertiroidismo induzido por amiodarona do tipo 1, corticoides orais no tipo 2, sendo este muitas vezes autolimitado, uma combinação destes últimos no de tipo misto/indefinido e levotiroxina em casos de hipotiroidismo induzido por amiodarona. Relativamente à temática da descontinuação e reintrodução de amiodarona, existe muita controvérsia, no entanto é consensual a não necessidade de paragem do tratamento com este fármaco em casos de hipotiroidismo induzido por amiodarona ou em pacientes com problemas cardíacos potencialmente mortais ou pacientes críticos com mau prognóstico que respondam bem a este fármaco. Em casos em que se considere a reintrodução de amiodarona após um quadro de hipertiroidismo induzido por este fármaco, é aconselhável a ablação terapêutica da tiroide prévia em pacientes com tipo 1 prévio, enquanto que monitorização é suficiente em pacientes após um tipo 2, devendo a monitorização ser apertada independentemente do tipo de hipertiroidismo induzido por amiodarona. Adicionalmente, existe a possibilidade de a amiodarona poder induzir o aparecimento de neoplasia maligna da tiroide, sendo, no entanto, um tema sobre o qual existem poucos estudos publicados. Também para certas populações, como a população pediátrica e as grávidas, existe pouca evidência e informação científica relativamente ao impacto da amiodarona na sua saúde, sendo necessários estudos mais abrangentes e exaustivos para se obter consenso relativamente à abordagem a seguir. Com este trabalho pretende-se conglomerar as principais características da amiodarona relacionando-as com a sua repercussão na tiroide, as diferentes apresentações clínicas de disfunção tiroideia, bem como propostas de abordagem diagnóstica, terapêutica e de monitorização para os diferentes quadros, o impacto deste fármaco na população de grávidas e pediátrica, a sua possível relação com neoplasia maligna da tiroide e alternativas a considerar ao seu uso.