Browsing by Issue Date, starting with "2020-02-28"
Now showing 1 - 1 of 1
Results Per Page
Sort Options
- Estudo de prevalência, fatores de risco e de características clínicas e serológicas de alergia alimentar em crianças dos 3 aos 11 anos, na Beira InteriorPublication . Jorge, Arminda Maria Miguel; Barata, Luís Manuel Taborda; Toledano, Felix LorenteIntrodução: A alergia alimentar é uma epidemia crescente em todo o mundo que afeta cerca de 6-8% das crianças. É uma situação altamente stressante para crianças e suas famílias, gerando elevado nível de ansiedade, associa-se a menor qualidade de vida, por vezes pior do que em muitas outras doenças crónicas e é frequentemente motivo de bullying. Os fatores de risco ainda não são totalmente conhecidos e o diagnóstico nem sempre é exato. Não existe uma terapêutica adequada e consensual, sendo a evicção o método de eleição para prevenir reações alérgicas e a adrenalina a terapêutica mais eficaz no tratamento das reações alimentares mais graves, de anafilaxia potencialmente fatal. É de primordial importância conhecer a realidade da nossa população quanto a aspetos de alergias alimentares, avaliar melhor a patologia envolvida, melhorar a literacia das crianças alérgicas e seus cuidadores, bem como dos profissionais de saúde, em relação a esta área de patologia clínica, com o objetivo de tornar os diagnósticos de alergia alimentar mais exatos, adequar as medidas de evicção evitando as dietas demasiado restritivas e por vezes desnecessárias, prevenir e tratar as reações potencialmente graves. Objetivos: Construir e validar um questionário destinado a crianças com suspeita de alergia alimentar baseado nos conhecimentos científicos sobre a área, que inclua os aspetos considerados importantes para identificar o(s) alimento(s) suspeito(s) e caraterizar a reação ocorrida de modo a identificar crianças em risco de reação grave e orientar estudos adicionais. Avaliar a prevalência de reação adversa a alimento (RAA) e alergia alimentar (AA), identificar os alimentos mais implicados e as características clínicas e laboratoriais da alergia alimentar em crianças da Beira Interior. Avaliar o impacto dos fatores de risco mais consensuais para AA e RAA na população estudada. Refletir sobre a implicação prática deste estudo, a nível individual, familiar e populacional, nas medidas de saúde pública e na melhoria contínua dos cuidados de saúde. Materiais e métodos: Construímos um questionário de reações adversas a alimentos baseado em questionários validados em outros países e questionários portugueses não validados. O questionário foi revisto por imunoalergologistas e foi desenvolvida uma análise exploratória com a sua aplicação em crianças com alergia alimentar conhecida. A fiabilidade foi avaliada por teste-reteste em crianças com suspeita de reações adversas a alimentos. Para avaliar a estabilidade temporal e reprodutibilidade usámos o teste de correlação de Spearman Rho e o índice kapa de Cohen. Este questionário, designado como Q2, foi aplicado nas crianças que tinham tido resposta positiva a um curto questionário preliminar simplificado (Q1) que perguntava se havia alguma suspeita de reação adversa a algum alimento. A prevalência de reações adversas a alimentos foi avaliada em crianças entre os 3 e 11 anos da região da Cova da Beira através do questionário de reações adversas a alimentos. Nas crianças com alimentos suspeitos, foram adicionalmente efetuados testes cutâneos por picada e determinados os níveis séricos de IgE específicas para os alimentos implicados. Foram ainda analisadas as características clínicas das reações, e recolhidos dados relativos aos antecedentes pessoais e familiares de atopia. Os fatores de risco genéticos e ambientais foram avaliados para todas as crianças com Q2 positivo. Para além da caracterização demográfica e das reações ao(s) alimentos(s) implicados, foram analisados os antecedentes pessoais e familiares de atopia, o tempo de amamentação e idade de introdução de alimentos sólidos e reações ocorridas na diversificação alimentar. Foram ainda analisados os dados dos estudos in vivo e in vitro de atopia. Foi feita uma análise comparativa do grupo de crianças com AA provável (crianças que, em Q2, apresentavam alimento suspeito, com reação IgE-Mediada) e grupo AA possível não IgE-Med (crianças que em Q2 apresentavam alimento suspeito, com reação não IgE-mediada). Para todos os testes estatísticos foi considerado significativo um valor de p inferior a 0,05. Resultados: Das 4045 crianças em idade escolar, 2474 (61,2%) aceitaram responder ao questionário inicial e foram incluídas no estudo. A prevalência de reação adversa a alimentos foi de 7,1% (IC95%: 6,2-8,1), baseada no questionário inicial (Q1). Em 115 crianças manteve-se a suspeita após aplicação presencial do Questionário alargado de reações adversas a alimentos (Q2). O questionário Q2 foi reaplicado a 50 crianças com suspeita de alergia alimentar, cerca de 3 semanas após o teste inicial. O questionário mostrou boa estabilidade temporal (coeficiente de correlação de Spearman de 0,834), e boa reprodutibilidade (apenas 2 dos 27 items apresentaram índice Kappa <0,60). Com base no questionário alargado (Q2), aplicado presencialmente, a prevalência de AA autorreportada, foi de 4,6% (IC95%: 3,9-5,5). A prevalência de alergia alimentar “provável” (definição baseada em questionário Q2 positivo para algum alimento e evidência de mecanismo IgE-Mediado – Teste cutâneo por Picada (TCP) e/ou IgE elevada para esse alimento) foi de 1,4% (IC95%: 0,9-1,9). Os alimentos mais implicados foram os frutos frescos, o peixe e o ovo. O primeiro episódio ocorreu em idade mais precoce, reações mucocutâneas e anafiláticas foram mais associadas a RAA IgE-Mediadas que a Reações não IgE-Mediadas. A prevalência de alergia possível a frutos (autorreportada, baseada em Q2) foi de 1,69 (IC95%: 1,19-2,21) enquanto a alergia provável a frutos (AFr - baseada em questionário e estudos in vivo e in vitro com evidência de mecanismo IgE-Mediado) foi de 0,61% (IC95%: 0,30-0,92). Apesar de morango, citrinos e kiwi serem os frutos mais implicados na alergia a Fr possível, na AFr provável os frutos mais implicados foram o kiwi, o pêssego, a banana e o morango. Os primeiros sintomas ocorreram em idades precoces (média 2,5 anos). Na AFr provável, 47% das crianças estavam sensibilizadas a dois ou mais frutos e as manifestações clínicas foram mais frequentemente imediatas e monossintomáticas: urticária/angioedema (57.1%), síndrome alérgica oral (SAO) (64,3%). Todas as crianças alérgicas a frutos estavam sensibilizadas a pólenes e a sensibilização a látex foi positiva em 71,6% das crianças com alergia a frutos com reatividade ao látex conhecida (síndrome látex-frutos). O sexo masculino, os antecedentes pessoais de doenças alérgicas, marcadores in vitro de atopia e a sensibilização a aeroalergénios foram significativamente mais frequentes nas crianças com AA Provável (IgE-Med) do que no Grupo com AA possível, não IgE-Mediada. Já a residência em área urbana ou rural, o nível socioeconómico, a diversificação alimentar, não mostraram diferenças estatisticamente significativas entre os dois grupos. Menor tempo de aleitamento materno foi mais associado ao Grupo não IgE-Med e a introdução de alimentos sólidos entre os 4 e os 6 meses mostrou estar significativamente menos associada à probabilidade de ter uma AA IgE-Med, comparativamente com a sua introdução após os 6 meses. Conclusões: O questionário desenvolvido apresentou boa estabilidade temporal e reprodutibilidade, podendo ser utilizado de modo padronizado para rastreio de RAA permitindo uma abordagem uniformizada e passível de estudos comparativos futuros. A prevalência de alergia alimentar provável em crianças portuguesas da Cova da Beira é baixa, e os pais tendem a sobrevalorizar as queixas destas, sendo a prevalência de AA significativamente mais elevada quando se baseia apenas em questionários presenciais do que nesses questionários em associação com estudos in vivo e in vitro. Os alimentos mais implicados são os frutos frescos e peixe. As reações IgE-Mediadas são mais frequentemente imediatas, polissintomáticas, mais severas e começam em idades mais precoces que as reações não IgE-mediadas. Apesar do morango e os citrinos serem mais frequentemente reportados (alergia possível), um mecanismo IgE-Mediado demonstrado (alergia provável), bem como a manifestação clínica de SAO estão mais associados ao kiwi e ao pêssego. Nas crianças com AA provável, a sensibilização a mais do que um fruto é frequente e as manifestações são tipicamente mucocutâneas, imediatas e monossintomáticas. A reatividade cruzada com pólenes e látex é bastante frequente.O perfil de risco para AA provável, IgE-mediada, envolveu significativamente mais o sexo masculino e a presença de atopia pessoal, no nosso estudo. Pelo contrário, um menor tempo de amamentação, a presença de atopia familiar, o nível socioeconómico e o local de residência não se associaram a um risco acrescido para alergia alimentar, IgE-Mediada.