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Abstract(s)
Roberto de Mesquita. Poeta. Nascido e criado na ilha das Flores, um minúsculo pedaço de terra, 141,7 km2, que marca a fronteira mais ocidental do território
português. Aí conviveu com uma natureza quase edénica, em alguns aspectos, ainda,
inexplorada, mas caprichosa e exposta à fúria dos elementos, particularmente nos
meses mais rigorosos, correspondentes às estações do Outono, do Inverno e de parte
da Primavera. Os momentos de bonança eram relativamente breves, correspondiam,
por regra, a uma parte da Primavera e ao Verão. Ostentavam o dom de permitir o
retemperar dos ânimos, pois facilitavam a comunicação com o exterior, insular e transcontinental, assistiam à chegada dos familiares, em “dia de São-Vapor”1,
emigrados nas Américas ou radicados nas restantes ilhas do arquipélago e no
continente português, e dos forasteiros, curiosos e intrigados com os usos e costumes
deste povo peculiar:
«Oh, meu Deus! Descubro que a gente enterrada há cinquenta anos se encontra outra vez nas Flores, viva e aferrada às mesmas palavras e às mesmas manias do passado, numa meia-sombra em que se cria bolor. Estou talvez no Purgatório – o Inferno é mais ao norte… Certos seres mortos na minha mocidade, e que eu não sabia onde se tinham metido, foram desterrados para as Flores.»
Dos condicionalismos da vivência em meio insular, procuraremos dar razão, na
Parte I deste trabalho, procedendo a uma caracterização, de forma necessariamente
breve, da geografia física e das circunstâncias atmosféricas que condicionam o
arquipélago açoriano (Sub-capítulo 1.1). Do mesmo modo, conscientes do efeito modelador do meio ambiente sobre as sociedades humanas, torna-se incontornável a
referência aos traços idiossincráticos mais relevantes do habitante ilhéu, que o
diferenciam, de algum modo, dos seus compatriotas residentes em outros espaços do
solo pátrio (Sub-capítulo 1.2), contamos com o apoio de alguns estudos de natureza
sociológica, realizados por relevantes personalidades, nos contextos regional e
nacional.
A relação dialéctica alimentada pelo papel do homem em interacção com o
meio onde vive, a constatação das suas singularidades, o estabelecimento de formas
específicas de expressão social, cultural e religiosa, consolidando-se ao longo de cinco
séculos de história insular, marcam, indelevelmente, a psique e o modo de estar no
mundo dos açorianos. Estas marcas constantes e significativas surgem plasmadas no
conceito de “açorianidade”, proposto por Vitorino Nemésio, e de que apresentamos os
seus traços mais significativos no Capítulo 2.
Estas realidades humanas e geográficas, sui generis, por sua vez, deram lugar a
universos ficcionais que, no plano da literatura, constituem aquilo a que,
progressivamente, se vem convencionando chamar de Literatura Açoriana. Trata-se,
pois, de um corpus de textos, produzidos por autores açorianos ou que residiram no
arquipélago o tempo suficiente para compreender e assimilar os valores, o modo de
sentir e de encarar a vida, tal como ela é experienciada no arquipélago, textos esses
enquadráveis nos diversos modos e géneros literários, versando sobre temática
açoriana: as suas gentes, a sua cultural, o seu linguajar característico, a sua
mundividência, etc. Uma vez que a discussão sobre a existência, ou não, da
denominada Literatura Açoriana se mantém actual, procuraremos fazer uma resenha
histórica dessa problemática (Capítulo 3), pautando-nos pelas posições assumidas
entre a crítica mais abalizada.
Estabelecidos estes pressupostos, geográficos, sociológicos e ideológicos,
propomo-nos recuperar a obra poética de Roberto de Mesquita, no intuito de pôr em
evidência os vários diálogos intertextuais que ela mantém com os diversos policódigos
estético-literários que caracterizam a poesia portuguesa finissecular (Parte II). Deste
modo, o presente trabalho apresenta-se como mais um contributo para a
compreensão e afirmação da qualidade estética e literária de Almas Cativas, ao mesmo tempo que procurará chamar à atenção para a necessidade de se recuperar e
homenagear uma figura e uma obra singulares no plano da criação literária, tal como ela se apresenta nos Açores, e no contexto da poesia portuguesa de fins de Oitocentos e inícios do século XX4.
Vivendo toda a vida nos Açores, principalmente na sua terra natal, a ilha das
Flores (estudou um ano em Angra do Heroísmo – 1885; transferiu-se para a Horta,
onde se manteve até 1890/1891, quando deu por terminados os estudos; em 1897,
radica-se em S. Roque do Pico, trabalhando como escriturário da Fazenda Pública,
sendo no ano seguinte transferido para Santa Cruz das Flores; em 1912, toma posse
como chefe de Finanças na ilha do Corvo, onde permanece quase um ano; a sua única
saída ao continente português acontece em 1904, a fim de se apresentar a concurso
para escrivão da Fazenda Pública e, nessa viagem, desloca-se até Viseu, para se
encontrar com o irmão, à época professor de Liceu nesta cidade, tendo ainda ensejo
de conhecer, pessoalmente, Eugénio de Castro e Manuel da Silva Gaio, amigos de Carlos de Mesquita)5, Roberto de Mesquita foi capaz de, através da leitura, contornar
as limitações que a insularidade lhe impunha, tomando conhecimento com a obra dos mais importantes autores da poesia finissecular, quer nacional, quer estrangeira.
Na terceira e última parte deste trabalho, retoma-se a questão da Literatura
Açoriana, procurando explicitar-se elementos caracterizadores da “açorianidade”
presentes em Almas Cativas e, por esse facto, susceptíveis da integração da obra
poética mesquitiana no âmbito e dentro dos limites daquele universo literário.
Pretende-se, pois, deste modo, confirmar a opinião de um dos mais argutos críticos da poética mesquitiana, Vitorino Nemésio, que vê na poesia do autor florentino a manifestação mais acabada do “perfil difuso e abúlico da açorianidade”.
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Keywords
Literatura açoriana Estética romântica
Pedagogical Context
Citation
Publisher
Universidade da Beira Interior
